Há bons motivos para se fazer 60 anos!
O primeiro deles, talvez, seja o fato de não me reconhecer como aquela ‘senhorinha’ que imaginava que seria nesta idade.
Prova disso é que acabo de percorrer “de cabo a rabo” a Trilha Salkantay no Peru.
É verdade que o espelho já não traduz a ‘mocinha’ (nem tão mocinha assim) que habita dentro de mim! Muitas vezes vou ao fundo do poço!...
Outra vantagem dos 60 é pagar meia-entrada e, de vez em quando, ter o assento cedido no ônibus ou metrô por algum marmanjo culpado, ou simpático (a) jovem, gentileza que quando estou cansada aceito sem pestanejar! Confesso que esta experiência nem sempre é vivida com total desprendimento, ou mesmo alegria, na medida em que a constatação deve estar ‘na cara’ desta privilegiada!
Pois é, mas fazer 60 anos valeu-me a liberdade – para muitos a ousadia – de escolher alguns modos de comemoração. E viajar com a Pisa Trekking para Machu Picchu foi um deles. E, creiam, valeu à pena!
A ‘caminhada’ de 58 km, fora os três dias de Cuzco, foi o pretexto por mim encontrado para continuar em peregrinação – constatação que me comove e encanta porque vem de encontro às indagações que faço a respeito do destino e da natureza humana. Viver, ser, é peregrinar! Não é um acaso! A vida, segundo o meu parecer, não nos dá o poder de escolher se queremos, ou não, prosseguir na marcha. Em qualquer lugar que estejamos, imbuídos, ou não de credos, princípios arrazoados, ou não, ou seja lá o que for. Mas a vida nos beneficia do indulto de escolher os caminhos a serem trilhados e também de como gostaríamos de fazê-lo, até para, quem sabe, com o tempo, deixá-la tomar o seu rumo próprio.
Apesar da satisfação de ter cumprido a meta em relação aos quilômetros percorridos, não foram eles o objetivo principal. Em verdade, o desejo – e necessidade - de refletir sobre a vida (que pode estar no final do segundo tempo) – presente, passado e futuro – foi a motivação genuína. E se pensar sobre a vida significa trazer para bem perto – e ser eternamente grata – às pessoas queridas: filhos, netos, genros, marido, pais, irmãos, amigos... É também dedicarmos as nossas melhores e maiores energias ao mundo e suas pessoas.
O contato com a natureza sempre produziu em mim, desde pequena, aquilo que a filosofia oriental traduz, grosso modo, como meditação: Ser o próprio céu, que é, por sua vez, experimentar a natureza da mente.
Se Cuzco e Machu Picchu dispensam comentários em relação a sua beleza e riquezas ancestrais, o impacto vivido diante do silêncio da caminhada e a experiência de comunhão de intenções junto aos companheiros de viagem, foi algo indescritível! Principalmente dos jovens: engraçados, atenciosos, carinhosos e destemidos! Jovens! Fazia tempo que não experimentava, com adultos, a leveza dessas situações! Pacha Mama! Ah!... E como isso foi intenso!!! E como foi intensa – e gratificante – experimentar a intensidade de todos! Assim como foi indescritível sentir os aromas da natureza mesclados ao cheiro do café, do mingau dos trabalhadores que já nas primeiras horas da manhã se punham a trilhar, qual peregrinos, os seus caminhos, confirmando para o bem, e para o mal, o tom e a cor da vida a ser vivida. Até, para em seguida, poder me recolher!...
Agradeço à Pisa Trekking ter me proporcionado junto ao longo caminho das montanhas, aquilo que minha querida amiga Luci ao ouvir minhas histórias, cunhou como tendo sido a representação das “melhores sínteses de minhas 60 voltas pela vida”.
Com carinho,
Virgínia Chamusca